22 de abril de 2005


"A coisa em si, nunca: a coisa em ti." (Mário Quintana)

Para ela o verde não trazia esperança. Só medo.
Raquel Medeiros

Era muito criança e os medos eram poucos. Não eram poucos, na verdade, mas tinham seu encanto, misturavam-se à curiosidade e ao atrevimento que lhe eram peculiares.
Tinha muito medo daquele seriado, O Incrível Hulk. Assistia sempre.
Não entendia muito bem a história, mas esperava avidamente a hora da transformação – a roupa rasgando, a pele esverdeando -mas quando chegava a hora de mostrar a face transformada e furiosa do personagem, ela corria pra debaixo da cama. E ficava lá, até sentir que ele resolvera seus desafetos e voltara à forma humana. Tudo isso pra esperar a próxima transformação. Sempre assim. Todas as tardes.
Agora é uma mulher. Seus medos são outros. Ainda guarda a curiosidade e o atrevimento característicos, mas sente falta de ficar embaixo da cama quando o medo chega ao ápice. Eles agora aparecem a qualquer hora do dia. E desde que começou a dormir na rede, não há mais cama pra se esconder.
Não tem mais medo do Hulk, agora acha até engraçado, ridículo. E torce para que os medos de agora lhe provoquem risadas depois.

Sobremesa: "Tinha que ser dor e dor/ esse processo de crescer/ tinha que vir dobrado/ esse medo de não ser/ tinha que ser mistério/ esse meu modo de desaparecer." (Paulo Leminski)

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