23 de agosto de 2004

Neste verão, vou mergulhar no inverno
Raquel Medeiros

Mais uma carta. Mais uma vez a tristeza, a melancolia.
Me sinto ora pisando em ovos - e tenho medo de quebrá-los; ora pisando em cacos de vidros, tentanto, em vão, fazer com que a dor física sufoque a emocional.
Faz um lindo dia de sol lá fora. Coloquei as roupas e os sapatos pra secarem. Mas a alma, esta insiste em permanecer no inverno. Estação que gosto muito - é verdade - e que alma está mergulhada há um tempo. Temo que ela morra afogada, ou mesmo não queira sair de lá. Será que pra ela é mais confortável? Movimentos mais lentos, ausência de sons externos, nada de humanos egoístas. Só peixes tranqüilos, preocupados com a sua próxima refeição.
Sabe, até que a água parece um lugar bastante agradável. No inverno as pessoas têm medo de entrar nela. E isso proporciona tempo suficiente pra se ficar sozinho, pensar sobre as coisas, com movimentos e pensamentos lentos; sem pressa de emergir.
Sabe de um coisa? Acho que vou dar um mergulho. Um profundo mergulho. Volto já. Porém minha concepção de "já" pode ser diferente da sua.

Sobremesa: "Faço longas cartas pra ninguém/ e o inverno no Leblon é quase glacial". (Inverno - Adriana Calcanhoto)

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